Hoje eu viela
E ela mudou bastante
Mesmo ainda sem ladrilhos
De pedrinha cintilante
E vi seus filhos
Como eu antigamente
Correndo por ela
Contentes, inocentemente
Viela crescendo
Sempre sendo mão de mais alguém
Viela acolhendo
Os que nada tem e nem a ninguém
Viela dando abrigo
Pra sonho de vida melhor
Na esquina há perigo
Mas já viela pior
Viela desrespeitada
Como se fosse nada
Ate as tia enquadrada
Só por ser favelada
Viela discriminada
Viela calada
Viela lavada
De sangue na fita dada
Viela sem saída
Ou se acabar no escadão
Viela encontrando outra
Aumentando a ocupação
Viela e a população
Da favela
Um mutirão de vela
Contra a escuridão da cela
Viela desamparada
E sem endereço
Já viela alagada
E sem manjedoura pra berço
Viela mal iluminada
E cheia de lodo
Viela assustada
Vendo o bicho passar o rodo
Viela descalçada
Não se pisa sem cuidado
Pedras rolam, tombo certo
Ninguém ta desavisado
É viela, então
Vê direito
Pisa devagar
Que o bagulho é daquele jeito
Viela em barricada
Pela morte d’uma filha
Que foi executada
Por organizada quadrilha
Viela em chamas
Debaixo de tiro e gás
Anciões, bebês e damas
Sem direito à paz
Depois disso
Ainda viela mais forte que antes
Mesmo tendo filhos difamados
Como meliantes
Viela ser reconstruída
Pelos vizinhos
Viela mais unida
Não estamos mais sozinhos
Viela guardando campana
De cima da laje
Viela que na atividade
Não admite cagoetage
Viela assediada
No jornal policial
Viela interrogada
Pela seccional
Viela marginalizada
Por toda sociedade
Viela criminalizada
Por ser da comunidade
Por que ela é perseguida
Por que ela é suspeita
Será por viver a vida
Em perspectiva estreita
Se ela falasse
Um comício faria
Talvez assim melhorasse
A vida na periferia
Mas se ela se declarar
Será usado contra ela
Que não é uma alameda
É apenas uma viela
Quando eu a vi
Não foi amor ao primeiro olhar
A achava feia
Constrangedora e vulgar
Hoje eu entendo ela
E a gente que vive nela
Sem vergonha de dizer
Como eu: é nois favela
Dugheto Shabazz - ZAPEÃO DOS ZAPEÕES
Nenhum comentário:
Postar um comentário